Lembro bastante da minha infância. Dos Trapalhões e do “Xou da Xuxa”, que tinha dois assistentes de palco, um fantasiado de mosquito da dengue, e o outro que se chamava Praga. Lembro do Clube do Bolinha, um programa de calouros, com dançarinas de maiô cavado, e as pessoas podiam fumar no auditório; me lembro da Vovó Mafalda, que claramente era um homem, e que eu achava que era o mesmo ator que interpretava a Velha Surda – não era. She-Ra, Thundercats, He-Man, Muppet babies, Cavalo de Fogo. A “Bruxa do 71”, que tinha um gato chamado Satanás.
Me lembro de socializar na rua com brincadeiras de piques de tudo que é jeito, elástico, queimada, garrafão… papo na calçada de casa, festinha americana. Baré sabor tuti-fruti, dividida por três, Fórmula 1 todo domingo. O auge dos Simpsons, o nascimento da MTV, calça de cintura alta. O tetra do Brasil, com todo mundo estourando fogos na rua para comemorar.
Lambada, axé, o funk de MC Marcinho e de Cidinho e Doca. Mais tarde, Sandy e Júnior, Skank, Planet Hemp. As mortes de Cazuza, Fred Mercury e Renato Russo, vítimas do HIV. A queda do avião que extinguiu os Mamonas Assassinas e a do helicóptero que matou Ulysses Guimarães; o assassinato de PC Farias e a violência contra Daniela Perez.
A eleição de Fernando Collor, e aquela história de confisco das poupanças todo dia na TV. Me lembro da instituição do plano real, e que nós recebemos em casa uma cartilha ensinando a fazer a conversão da moeda, que eu usava todo dia para ter certeza que um pacote de salgadinho custava apenas vinte centavos.
Me lembro muito também da minha vivência escolar. Aula de estudos sociais, culinária, artesanato e natação. Antes de entrar na sala de aula, formação no pátio; distância de um braço esticado do colega da frente. Para ir até o refeitório, fila e mãos dadas. Dizer que não gostava do colega não era desculpa, porque ele era a sua mão até lá. E o meu colega era tímido… percebendo, eu fingia que dava a mão a ele. Empatia, aos seis, sete anos de idade.
Esportes. Primeiro aula teórica para saber os fundamentos de cada modalidade. Dança também. Então, aquele colega que não era bom de bola, as vezes podia ser bom de bailado. Não existia ninguém ruim em tudo. O recreio era com todo mundo junto. A maioria de nós tem contato até hoje.
Do que nossas crianças de hoje se lembrarão no futuro? Como será seu desenvolvimento social, sem convívio com outras da mesma idade, sem o amadurecimento da memória? Se a vida é baseada em experiências, se essas experiências ditam comportamentos nos adultos, como será a progressão infantil da geração Covid? Saberão conviver com a diversidade, se todos os dias assistem ao mesmo padrão social, trancadas em casa? Temos Governantes que estão pensando em políticas educacionais diferenciadas pós pandemia ou vai sobrar para as pedagogas? No futuro, iremos gostar da pureza da resposta das crianças?