O Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) e instituições do sistema de Justiça dos Estados do Espírito Santo e de Minas Gerais e federais obtiveram uma decisão histórica no Caso do Rio Doce. A Justiça Federal condenou a Vale, a BHP e a Samarco a pagar R$ 47,6 bilhões a serem atualizados desde a data do fato, em 5 de novembro de 2015, como indenização pelos danos morais coletivos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais.
Conforme a decisão, o valor deve ser corrigido monetariamente desde a data da decisão e com juros de mora desde a data do desastre, ocorrido em 5 de novembro de 2015. O montante será destinado a um fundo administrado pelo governo federal e aplicado exclusivamente nas áreas impactadas pelo desastre.
Dessa forma, a decisão reconhece a aplicação do recurso no litoral capixaba, que também foi atingido pelos resíduos do desastre, a partir da foz do Rio Doce, em Linhares: “Os recursos serão destinados ao fundo previsto pelo art. 13 da Lei nº 7.347/85 e regulamentado pelo Decreto nº. 1.306/94 e deverão ser utilizados exclusivamente nas áreas impactadas, assim reconhecidas, a saber, os municípios previstos no TTAC, na Deliberação nº 58/2017 do CIF, e demais casos em que houve o reconhecimento por decisão judicial”.
A decisão decorre de uma petição protocolada pelo MPES e demais instituições do sistema de Justiça no dia 16 de outubro de 2023. Na ocasião, as instituições requereram o julgamento antecipado parcial de mérito e pedem a condenação das empresas Vale, BHP e Samarco em dano moral coletivo no valor de R$ 100 bilhões, equivalente a 20% do lucro líquido da Vale e da BHP dos últimos três anos.
O MPES, por meio do Núcleo Permanente de Direito Processual Civil e Impactos do Novo CPC (Nuproc) e do Grupo de Trabalho para Recuperação do Rio Doce (GTRD), participou participaram ativamente da confecção da petição.
Coordenadores
A coordenadora do GTRD do MPES, Promotora de Justiça Elaine Costa de Lima, considerou a decisão “histórica”: “No exato dia em que o desastre de Brumadinho completa 4 anos, a Justiça brasileira condena as empresas Vale, BHP e Samarco, de forma solidária, em danos morais coletivos pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, ocorrido há mais de 8 anos. É o maior desastre ambiental da mineração ocorrido no Brasil”.
Salientou também o total de municípios atingidos no desastre e disse que o MPES, com as demais Instituições de Justiça envolvidas no caso desde o dia do rompimento, luta pela justa e integral reparação dos danos socioambientais e socioeconômicos. “Hoje esses danos são parcialmente reconhecidos por essa decisão. As empresas Vale, BHP e Samarco negam as responsabilidades, mas são mais de 50 municípios atingidos e mais de dois milhões de pessoas que tiveram sua vida impactada com a lama e seus efeitos. Portanto, a decisão de hoje, embora passível recurso, é um alento na luta pela reparação da violação de direitos humanos no Brasil.”
O coordenador do NUPROC, Promotor de Justiça Hermes Zaneti Junior, mencionou a importância do uso da técnica processual da antecipação parcial do mérito que permite a decisão definitiva de capítulo da sentença que apresenta causa madura.
“O dano moral coletivo ambiental in re ipsa objeto da condenação decorre do reconhecimento da responsabilidade e do nexo de causalidade, importante marco no caso. Por fim, como a matéria ambiental é tutela de direito fundamental e humano, a decisão fez muito bem em reconhecer o direito humano ao reconhecimento da responsabilidade como medida reparatória, seguindo os precedentes da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, ressaltou.
Rompimento
O rompimento da Barragem do Fundão completou oito anos no dia 5 de novembro de 2023. Considerado o maior desastre ambiental do país, deixou 19 mortes e provocou o despejo de 44 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração. A lama poluiu toda extensão da bacia hidrográfica do Rio Doce e parte do litoral capixaba, com municípios atingidos nos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, onde se localiza a foz do rio.
Ao acolher os pedidos do MPES e demais instituições, a Justiça julgou procedente o pedido de indenização pelo dano moral coletivo, considerando que “trata-se de fato incontroverso”.
“O impacto não se restringe às pessoas que moravam nas localidades atingidas. Gerações futuras serão afetadas. As comunidades foram impactadas em sua moradia, trabalho e relações pessoais. Pessoas foram mortas em razão do rompimento. Houve a degradação ambiental, com destruição da flora e fauna, o que inclui o sofrimento de animais. Houve perda da qualidade de vida. O rompimento gerou efeitos no ecossistema, com interferências negativas em várias cadeias produtivas e processos ecológicos. Enfim, são vários os danos, os quais devem ser devidamente reparados”, consta na decisão.