A asfixia econômica é uma realidade também no Brasil causada pelas mesmas mãos que tentam salvar vidas diante da ameaça do novo coronavírus. E diante de uma série de medidas restritivas quanto ao funcionamento de atividades diversas, é comum que alguns setores se rebelem. Nesta semana, os donos de bares – com as portas fechadas há mais de 100 dias por força de decreto estadual – protestaram em frente à prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim reivindicando a reabertura de suas empresas.
Daí, surge um ponto curioso: o município pode fazer um decreto na ‘contramão’ ou afrouxando a rigidez de um publicado pelo governo do Estado? O prefeito tem ou não essa autonomia diante da ‘caneta’ do governador – em especial neste período de calamidade na saúde pública? De quem é a última palavra?
“A reposta, se for seguida da linha lógica do que vem decidindo o Supremo Tribunal Federal (STF), é o prefeito!”, afirma o advogado Samuel Abraham Locatel Chipamo. “Precisamos responder à luz dos mais recentes entendimentos do STF sobre diversos temas, mas todos ligados a saúde, políticas públicas de enfrentamento, onde o Tribunal foi instado a se manifestar”.
Segundo Samuel, com base no STF, os municípios não podem ser tingidos pela administração federal em suas medidas de enfrentamento da pandemia e, nessa linha, também não poderiam os Estados intervirem nos municípios.
Na mesma referência, “os municípios podem decidir sobre quarentena, isolamento e serviços essenciais (sem impedir o trafego interestadual). E podem flexibilizar quarentena, desde que tenham recurso sobre pena de improbidade, nos moldes do que decidiu o Ministério da Saúde”.
O advogado Wilson Márcio Depes opina que o governador, cuidando da saúde da população, calcado em determinações científicas, está correto em seu decreto. E, por extensão, ainda de acordo com Wilson, o chefe do Executivo municipal adota também posição adequada.
“Porém, dispõe o art. 30, I, da CF, que aos Municípios compete “legislar sobre assuntos de interesse local”, competência que indica, logicamente, que é o interesse local dos munícipes que deve constituir o foco principal da atuação dos administradores municipais. Resumindo, a autonomia e o interesse local fazem parte da essência da ideia”, afirmou Depes, que, pessoalmente, avalia que o “afrouxamento do isolamento é uma temeridade”.
Prefeitura
Na avaliação do jurídico da prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim, “o município pode ser mais restritivo, a flexibilização só o Estado pode autorizar”. Ou seja, no caso, a administração municipal não teria autonomia para ‘afrouxar’ um decreto estadual.
E é neste entendimento que a prefeitura tem agido: seguindo os decretos estaduais. “O que o município tem feito é levar o pleito dos segmentos para avaliação do Governo, como ocorreu com as academias, setor de eventos e de comércio”.
“Município não pode flexibilizar mais que o Estado”, diz Ministério Público
O Em Off Notícias também ouviu o Ministério Público sobre a existência ou não de autonomia do município diante de decretos estaduais, principalmente neste período de pandemia da Covid-19. A promotoria local, inclusive, já fez recomendação à prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim para que ela siga os decretos estaduais.
“A Promotoria de Justiça de Cachoeiro de Itapemirim entende que o Município não pode flexibilizar mais que o Estado. A proteção à saúde deve prevalecer. No caso de incompatibilidade entre as regras, deve prevalecer o ato normativo que confere maior proteção à saúde e à vida”, informou o promotor de Justiça, Cleto Vinícius Vieira Pedrollo.
“Numa oportunidade, expedimos recomendação para que fosse seguido o Decreto Estadual e fosse revogado Decreto Municipal que ampliou a circulação de pessoas em momento crítico da pandemia”, lembrou o promotor.
A referida recomendação foi assinada no dia 4 de abril e expôs, entre outras considerações, a necessidade da “união de esforços dos entes federativos neste momento, sendo imprescindível que o Município mantenha a harmonia com a regulamentação estadual, de modo a preservar a segurança jurídica e informação clara para a população”.
Confira abaixo a recomendação do Ministério Público à prefeitura de Cachoeiro de Itapemirim: