Por Jovanna Baby
Trago isso porque foi na capital do estado do Espírito Santo que na década de 70 e 80, mulheres travestis e mulheres cisgêneras que atuavam na noite na região do Parque Moscoso, centro de Vitória, decidiram criar a primeira associação no Brasil que concentrava essas duas mulheridades. Depois de uma ação violenta da Polícia Civil do estado que resultou em muitas prisões arbitrárias e autuações no artigo 59 do Código Penal Brasileiro que trata da vadiagem, essas mulheres lideradas por Jovanna Baby, Kelly Silva e Bianca Alencar. Sendo Bianca uma pessoa PCD, mas que trabalhava na noite e também sofreu com esses abusos policiais.
Ao sair da carceragem da Polícia Civil três dias após ser presas, essas mulheres decidiram se organizarem e fundarem a Associação das Damas da Noite. Anos depois a associação foi usurpada por pessoas chauvinistas. Porém as conquistas da mesma a partir de sua fundação foram bastante profícuas. Algumas das conquistas foram serem atendidas de forma descente nos Postos de Saúde à época, também a criação do Departamento de Apoio às Minorias – DEAM dentro do bojo da Secretaria de Segurança e da Cidadania – SEJUC, o qual a Assistente Social Arnúbia Pezende o gerenciou por vários anos. A redução da violência também foi uma conquista importante e a abertura de diálogo com os poderes públicos.
Em 1994 o estado do Espírito Santo vem através da associação realizar o 2º Encontro Nacional de Travestis e Liberados, o qual curiosamente contou com apoio da Polícia Militar do estado do Espírito Santo e as suas atividades foram realizadas no Teatro Maria Carmélia de Souza na Ilha do Príncipe. O evento também recebeu o apoio da chocolates Garoto em uma época em que jamais imaginaríamos tais parcerias. Fato curioso é que os carros da Polícia Militar transportavam as Travestis da Praia da Costa em Vila Velha até o Teatro durante os dias do evento, tendo em vista que todas as Travestis ficaram hospedadas em um abrigo para idosos cedidos pela Diocese de Vila Velha.
O encontro foi um marco nas sociedade capixaba, tornou-se o assunto por vários dias, inclusive o último dia do encontro aconteceu na Orla de Camburi a 1ª Marcha pela Diversidade Sexual, era um dia domingo, praia lotada, muitos aplausos, mas também muitas vaias, risadas e deboches, mas caminhamos plenas da altura do Hotel Pôr do Sol até a divisa com a Praia do Canto. Momentos históricos necessários de uma importância singular para a causa trans brasileira, porém segue apagado, não citado pelo bem do umbigo do atual Movimento que é muito mais chauvinista do que atuante. Esse resumo histórico não traz 1% do significado desses momentos para o estado do Espírito Santo e dessa história.
É preciso que o Movimento Trans Capixaba e nacional reconheça, não de forma a enaltecer a si própria, mas para garantir a essa cidade o seu direito histórico de ser o Berço da Civilização Trans Brasileiro. Quem nega o que é inegável é porque precisam puxar para si o protagonismo de uma causa que é latente e protagonizada há muitos anos e é nesse sentido que eu grito “Viva Jorginha de Mamãe da Praia de Soá, Raquel de Jardim América, Rosinha de Cobí, Suzete de Argentino Cabeleireiro, dentre outras capixabas históricas”.